LAUDOS ANTROPOLÓGICOS E CONFLITOS TERRITORIAIS NA COMUNIDADE QUILOMBOLA MANOEL CIRIACO DOS SANTOS – GUAÍRA PARANÁ
São poucos os
momentos em que somos tomados simultaneamente por sentimentos muito diferentes
e contraditórios. Ontem vivi esse turbilhão de sentimentos! Foi uma alegria
imensa e um privilégio passar a tarde tomando café e conversando com pessoas
que admiro demais e que são exemplos de luta e resistência. O café foi no
Quilombo Manoel Ciríaco dos Santos e a companhia não podia ser melhor, estivemos
juntos pesquisadores, lideranças da comunidade quilombola e lideranças
indígenas para levar nosso apoio e solidariedade à luta quilombola pelo
reconhecimento e delimitação de seu território.
A comunidade
quilombola vive mais um capítulo de sua história, aguarda o resultado do
período de contestação do laudo de reconhecimento da terra quilombola,
protocolado no final de 2016, uma das últimas etapas do processo de demarcação
de suas terras. Diferente de outros períodos mais conturbados, eles estão
tranquilos e serenos aguardando esperançosos a conclusão desse longo e doloroso
processo. O processo de reconhecimento do quilombo envolveu conflitos
terríveis, ameaças de morte e até mesmo o falecimento de uma liderança
quilombola que adoeceu durante esse período. Em todos os encontros que tivemos
com a comunidade a memória e a tristeza desses momentos são revividas e a cada
movimento de rememoração aprendemos mais sobre a história da comunidade
quilombola. Nessa tarde aprendi muito sobre essa história, mas aprendi também,
como pretendemos abordar, sobre antropólogos e a relação da antropologia com as
comunidades.
Para quem não
conhece a comunidade quilombola Manoel Ciriaco dos Santos, o processo de reconhecimento
e delimitação de seu território teve início em 2008 através de um convênio
firmado entre a Unioeste, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, e o INCRA -
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, para realização dos
relatórios necessários ao trâmite do processo. Foi também nesse período que se
iniciou uma relação desastrosa e conturbada entre professores ligados ao curso
de Ciências Sociais da universidade com a comunidade quilombola. Isso ocorreu
porque o trabalho de campo realizado deflagrou um intenso conflito social na
região do quilombo que provocou uma série de incidentes envolvendo a comunidade
quilombola e os produtores rurais de Maracajú dos Gaúchos, interior do município
de Guaíra. Ocorreram eventos e situações como cárcere privado de lideranças da
comunidade e funcionários do INCRA, ameaças de morte, bloqueio de carros
oficiais, danos ao patrimônio público, imposição de isolamento social contra a
comunidade quilombola, todos devidamente registrados na polícia, no ministério
público e na memória dos homens, mulheres e crianças dessa comunidade. CONTINUAR LENDO
Jacqueline
Parmigiani
Antropóloga
jacqueline.par@hotmail.com
Publicado originalmente em: Boletim Dataluta edição de abril de 2017 (http://www2.fct.unesp.br/nera/boletimdataluta/boletim_dataluta_4_2017.pdf)