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Encontro Estadual de Benzedeiras deixa legado e uma carta manifesto para a comunidade.

 ENCONTRO ESTADUAL DE BENZEDEIRAS  

No último final de semana, dias 13 e 14 de agosto de 2022, aconteceu na cidade de Irati, no centro sul do Estado do Paraná o Encontro Estadual de Benzedeiras, organizado pelo Movimento Aprendizes da Sabedoria (MASA). O evento reuniu cerca de 150 pessoas, entre benzedeiras, benzedores, curandeiras, curadores, costureiras de rendidura e machucadura, remedieiras, parteiras tradicionais, aprendizes, doulas, lavradoras, agricultoras, assentadas da reforma agrária, agroecologistas, faxinalenses, terapeutas, professoras, pesquisadoras, estudantes, artistas e artesãs de 28 municípios e 6 estados (PR, SC, RS, SP, MG, GO). A programação contou com exposições, oficinas, rodas de conversa e apresentações culturais, com o tema “Saberes e Práticas das Mulheres da Floresta de Araucária”, que se estendeu aos territórios da Mata Atlântica. A valorização, fortalecimento e reconhecimento do ofício de benzedeira e demais detentores de conhecimentos tradicionais de cura, como promotoras da saúde popular e defensoras dos territórios, o que envolve a manutenção das comunidades, matas e águas, é a principal reivindicação do Movimento das Benzedeiras. Formado em 2007, o MASA conquistou avanços legislativos nos municípios de Rebouças, São João do Triunfo e Irati, e em 2018 a Lei Estadual das Benzedeiras que as reconhece como patrimônio imaterial do Estado do Paraná. O objetivo do encontro foi trocar, ampliar e expandir experiências organizativas em prol do reconhecimento das identidades, conhecimentos e saberes tradicionais e ancestrais das benzedeiras em diferentes contextos.



Foto dos participantes do Encontro Estadual das Benzedeiras 

 

Trecho da Carta do Encontro Estadual das Benzedeiras:  


"Este Encontro Estadual é resultado da longa caminhada do Movimento das Aprendizes da Sabedoria (MASA), formado em 2007 por detentoras e detentores de ofícios tradicionais de saúde popular, dos territórios da região Centro-Sul do Estado do Paraná onde, por meio da organização e reivindicação étnica quanto povos e comunidades tradicionais, articulados como movimento social conquistou avanços legislativos na região, como em Rebouças, onde foi aprovada em 2010 a primeira lei das Benzedeiras (Lei Municipal no 1.401); em 2011 foi aprovada uma segunda lei no município de São João do Triunfo (Lei Municipal n°1370), e no ano de 2018, a terceira lei no município de Irati (Lei Municipal n° 4.543). Essas leis reconhecem as Benzedeiras dos municípios, garantem para elas o livre acesso às ervas e plantas medicinais e preveem o acolhimento das práticas tradicionais de cura no sistema formal de saúde. No caso de Rebouças, foi constituído a Comissão de Saúde Popular, via Decreto Municipal no027 aprovado em maio de 2010, com o objetivo de elaborar propostas e alternativas para esse acolhimento. 

Também destacamos a Lei Estadual 19689 que, em 2018, reconheceu nossas práticas como patrimônio cultural imaterial do Estado do Paraná. Esses avanços, ao longo dessa caminhada, foram contribuindo para romper com o preconceito e invisibilidade que sempre nos foi imposta. Estimamos que, só no Paraná, somos cerca de 17 mil pessoas, por isso queremos ampliar essas experiências para outras cidades, regiões e estados brasileiros. A organização de benzedeiras envolve, principalmente a atuação de mulheres que compartilham saberes ancestrais e práticas de cuidado de pessoas, de comunidades, das florestas, águas e terra, buscando construir modos de viver e bem nascer. A importância dos nossos ofícios tradicionais já é historicamente reconhecida pela população local, seja no campo ou na cidade, pelas incontáveis curas e tratamentos realizados, sobre diversas enfermidades, de forma acessível e sem custos, o que possibilita saúde a milhares de pessoas, nossa existência e resistência, nossa presença na atenção à saúde básica e cuidado, muitas vezes representam a principal garantia da saúde para inúmeras pessoas e por isso precisa ser reconhecida publicamente. E são os nossos corpos e saberes localizados que se colocam como fronteiras contrárias ao avanço dos monocultivos de soja, pinus e eucaliptos, esses sim causadores da destruição da Mata Atlântica, poluição da água e contaminação dos alimentos. A Mata Atlântica é o nosso território, é nela que estão nossos locais sagrados onde historicamente extraímos nossas ervas medicinais nativas e olhos d ́água e nascentes, para os tratamentos da saúde das pessoas das comunidades e bairros, é desse lugar que denunciamos a crescente privatização dos bens comuns com o aceleramento do desmatamento e envenenamento dos nossos recursos naturais, por parte de fazendeiros, empresários, que além disso, nos impedem o direito de livre acesso a esses recursos naturais para coleta de ervas medicinais nativas para continuarmos cuidando da vida e, nisso, não se diferenciam 

muito de organizações ambientalistas conservacionistas, e Unidades de Conservação que desconsideram a nossa ligação ancestral com esses territórios, sendo promotores de racismo ambiental. São esses ataques que propagam o racismo, a intolerância religiosa, e o desprezo aos nossos dons e as diversas violações aos nossos direitos de praticar nossos ofícios tradicionais de saúde popular, através dos conhecimentos, saberes e práticas tradicionais de cura, detidos por benzedeiras e curadores tradicionais pertencentes a diversos povos indígenas e comunidades tradicionais, rurais e urbanas. 

Onde vivemos, somos alvo de preconceitos, críticas e repressão dos órgãos públicos de saúde, algumas pessoas ligadas a igrejas, ruralistas e órgãos ambientais, que nos combatem de forma a tentar criminalizar nossos ofícios e dons. Nossas práticas são bens comuns e, mais do que direito nosso, também é direito de todo o povo brasileiro, por isso chamamos todas e todos de forma organizada para que se unam a nós para que os poderes democraticamente constituídos, reconheçam formalmente os nossos ofícios e dons, o uso desses conhecimentos e práticas, ervas medicinais e fitoterápicos no sistema Único de Saúde-SUS e o livre acesso aos recursos naturais que necessitamos para realizarmos nossas práticas tradicionais de cura, independentemente da constituição de propriedades particulares, ou de Unidades de Conservação. Vivemos um momento de ameaça à democracia onde toda a sociedade é empurrada para o mesmo local, onde historicamente nós e nossos ofícios, nossa existência, nossa autonomia e os nossos projetos de sociedade são ignorados. É também um momento em que novas doenças e pandemias começam a surgir denunciando que já passou da hora de nos reconectarmos, resgatarmos, retomarmos nossos saberes ancestrais e que representam uma forma mais igualitária de relação entre nós e o planeta onde existimos. Por isso tudo, decidimos coletivamente, e apesar de todas as ameaças e repressões que aumentaram nos últimos anos, chamar detentoras e detentores dos nossos ofícios e dons, bem como a sociedade em geral, em especial aos órgãos públicos ambientais e de saúde, e as universidades, para que juntas possamos compartilhar e multiplicar as nossas experiências de autorreconhecimento, de auto mapeamento das nossas territorialidades, das leis existentes e da aprovação de novas leis, bem como a reorganização das Políticas Municipais e Estaduais de Saúde a fim de incluir os ofícios tradicionais e fitoterápicos nos sistemas de saúde, contribuindo para projetar às presentes e futuras gerações esses saberes ancestrais que são o suporte da nossa existência e de toda a humanidade."

 

Mais informações e carta na íntegra em: https://linkr.bio/benzedeiras.masa

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