Quase cem pessoas foram intoxicadas no início de novembro no município de Espigão Alto do Iguaçu com Paraquate, um agrotóxico que está proibido na Europa desde 2007. O pequeno município, de 5 mil habitantes, fica no centro-oeste paranaense, 356 quilômetros da capital, Curitiba.
Trata-se do caso com mais vítimas na história recente do estado, responsável por 17% da produção nacional de grãos como soja e milho, numa área correspondente a pouco mais de 2% do território brasileiro. Dos 96 afetados, 52 são crianças, a maioria alunos de uma escola rural que funciona colada à área agrícola onde o veneno estava sendo aplicado.
A médica Lilimar Regina Naldony Mori, chefe da Divisão de Vigilância em Saúde da Secretaria da Saúde do Paraná, responsável pelo atendimento, classificou os casos como intoxicação leve e aguda – qualquer efeito à saúde resultante da exposição a um agrotóxico dentro de 48 horas, segundo a Organização Mundial da Saúde.
Crianças e adultos que entraram em contato com a nuvem de Paraquate relataram sintomas como fortes dores de cabeça, estômago e barriga, tonturas e vômitos. Todos condizentes com os de intoxicação aguda pelo agrotóxico, segundo o pesquisador Luiz Cláudio Meirelles, especialista em agrotóxicos da Fiocruz e gerente-geral de Toxicologia da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de 1999 e 2012. “Essas são reações bem típicas de intoxicação aguda por Paraquate, que também pode causar irritações de pele e lesões, principalmente na mucosa e na língua”, diz.
De acordo com Lilimar, não houve necessidade de internação e os sintomas desapareceram em até dez dias.
Foi sorte. A exposição aguda a quantidades maiores de Paraquate é quase sempre fatal, segundo a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA), que alerta sobre os riscos em uma publicação intitulada “Um gole pode matar”. A própria gerência de Toxicologia da Anvisa já alertou sobre os riscos do agrotóxico, num documento de setembro de 2017: “A exposição ocupacional ao Paraquate é relevante principalmente devido às evidências de maior sensibilidade humana à exposição dérmica a esse agrotóxico, com possibilidade de absorção sistêmica”.
O Paraquate foi comprado e utilizado na propriedade de Lino Passaia, o agricultor mais próspero da região, dono de quase 100 hectares (o equivalente a 1 quilômetro quadrado, ou mais de cem campos de futebol) apenas em Espigão Alto do Iguaçu, em que produz soja e milho. A contaminação foi causada pelo desrespeito a uma norma estadual que estabelece distância mínima de 500 metros entre a área pulverizada e “núcleos populacionais, escolas, habitações e locais de recreação”.
A história da intoxicação massiva de Espigão Alto do Iguaçu é um triste exemplo do uso indiscriminado e sem cuidados de agrotóxicos no Brasil. E de como mesmo as vítimas tendem a minimizar o risco a que estão submetidas. Continuar lendo.