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PRECISAMOS CONTINUAR DIALOGANDO SOBRE GÊNERO E SEXUALIDADE EM UMA SOCIEDADE QUE TEM A VIOLÊNCIA COMO RESPOSTA

Curitiba, 01 de outubro de 2018
Coletivo Enconttra


     Sensatez, informação, confiança e diálogo são palavras importantes para nosso convívio social, para pensar como queremos ser como sociedade, porém, está difícil encontrá-las juntas nesses tempos em que se confunde, “ser direto” ou “não ter papas na língua”, com a ofensa, a ameaça e a degradação de quem pensa diferente.
No Coletivo de Estudos sobre Conflitos pelo Território e pela Terra (ENCONTTRA) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) acreditamos firmemente que juntar essas quatro palavras sempre é a melhor opção para enfrentar o que não conhecemos, o que nos dá medo ou aquilo com o que não concordamos. Por isso, queremos mostrar todo nosso apoio às nossas amigas e colegas do Coletivo ENCONTTRA, Mailane Junkes Raizer da Cruz (Professora no Instituto Federal Catarinense – Campus Avançado Abelardo Luz) e Adriane Andrade (Mestranda do Programa de Pòs-Graduação em Geografia-UFPR) que viram como seu intento de divulgar informações sobre gênero e sexualidade através de um trabalho no 1º Congresso Nacional de Educação de Abelardo Luz foi criticado e divulgado como um ato condenável, chamando à mobilização em contra de toda a cidade, no passado dia 24/09/18. Nesse trabalho, as autoras mostram conhecimentos que nos ajudam a entender a sociedade em que vivemos, uma sociedade que muda, uma sociedade em que os que sofrem com discriminação e violência por seu gênero ou por sua orientação sexual já não se calam mais. No entanto, a partir da divulgação do conteúdo do trabalho nas redes sociais, sem o consentimento das autoras, houve uma reação contrária que desvia a atenção sobre onde, porque e quem sofre de violência cotidianamente.
Os dados são duros, mas nos alertam para o tamanho do problema e da violência que a sociedade brasileira sofre, ou uma parte dela. Segundo o Atlas da Violência de 2018, publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), fundação pública federal vinculada ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, no Brasil, a cada dia, são 606 casos de violência doméstica contra mulheres, 12 assassinatos e 164 estupros. Isso mesmo, por dia. E o grande problema é que as pessoas não contam, não vão na delegacia. Estima-se que apenas 10% dos casos dos estupros sejam notificados à polícia.
         Santa Catarina é o segundo estado, depois de Mato Grosso do Sul, onde se registram mais violações no país. Nesse ano de 2018, só de janeiro a maio, segundo a Secretaria de Estado de Segurança Pública do estado, 18 pessoas morreram por serem mulheres, 317 foram estupradas, 5.455 sofreram lesões corporais e 10.236 sofreram ameaças. Dados sempre muito menores dos reais pelo medo de falar, de se expor, do julgamento social.
No caso das lésbicas, gays, bissexuais, trans e travestis (LGBT) a situação é ainda pior: a cada 19 horas uma pessoa desse grupo morre no Brasil, o país que mais mata travestis e trans em todo o mundo, segundo o Grupo Gay da Bahia, entidade mais citada nos meios de comunicação que levanta dados de violência no grupo LGBT há 38 anos. O despreparo dos órgão de segurança e o descaso com as pessoas LGBT faz com que seja difícil encontrar dados confiáveis em Santa Catarina, mas a Polícia Civil admite que nos últimos três anos foram 495 pessoas que denunciaram ser vitimas de homofobia. Muita violência e muito silêncio ao redor.
       A solução não é reduzir os espaços de debate, de informação, de construção de conhecimento, de fortalecimento de direitos. Ao contrário, precisamos cada vez mais que as pessoas saibam que não têm que calar porque são mulheres ou porque têm uma orientação sexual livremente escolhida. Se a escola não faz seu papel de informar sobre diferenças e direitos, a sociedade perde, ignora um problema e aumenta o medo. O resultado de esconder as agressões não pode ser outro que mais violência diante da impunidade, de não “meter a colher”, de não fazer nada quando alguém é espancado ou estuprado.
          Apenas mais um dado estarrecedor do Atlas da Violência 2018: em casos de estupro de crianças com menos de 13 anos, os responsáveis pelos crimes são conhecidos e amigos da família em um 30% dos crimes. Pais e padrastos, com 12% cada, são os seguintes da lista.
        Apoiamos totalmente a coragem das nossas colegas Mailane e Adriane de querer oferecer conhecimentos que combatam essa violência que está arraigada nos lares e na sociedade em geral, de fazer com que possamos conversar sobre gênero e sexualidade como características que nos formam a todas e a todos, que nos permitem um lugar e um papel na sociedade que não têm porque ser inferiores ou com maior risco de sofrer com agressões. Precisamos de muita sensatez, informação, confiança e diálogo para erradicar essa violência que mantém com medo uma parte importante da sociedade. As escolas têm um papel importante, as famílias têm um papel importante, os meios de comunicação têm um papel importante… não podemos perder a oportunidade de fazer também a nossa parte, porque se omitir e querer esconder as informações é ser cúmplice desse estado de violência.

COLETIVO ENCONTTRA (Geografia/UFPR)

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