A 1ª. Feira saberes e sabores de Francisco Beltrão (PR) aconteceu na Praça da Matriz, nesta cidade, no dia 5 de julho de 2014. Foi organizada pelo Coletivo de Mulheres Agricultoras de Francisco Beltrão em parceria com a Prefeitura Municipal de Francisco Beltrão (Secretaria de Desenvolvimento Rural), com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR - FB), com representantes do Bairro Padre Ulrico e com a Universidade Estadual do Oeste do Paraná/Grupo de Estudos Territoriais (UNIOESTE/GETERR). O objetivo principal foi divulgar a produção de alimentos das famílias, especialmente a partir da participação das mulheres, valorizando-se, como o próprio nome da feira indica, os saberes e sabores gerados no município.
Também foi possível perceber algumas relações de cooperação e solidariedade entre as pessoas que participavam da feira, resultantes de uma cultura camponesa (THOMPSON, 1998) que é, historicamente, reproduzida em meio a uma miríade de outros comportamentos e valoresdifundidos principalmente pelas forças do capital. Na praça, parecia haver um campo de poder (RAFFESTIN, 1993 [1980]) efetivado por meio de uma apropriação territorial temporária – na praça, porém, importante para socializar pelo menos parte da diversidade de alimentos produzidos no espaço agrário e das plantas medicinais cultivadas na cidade Francisco Beltrão. Identificamos sinais muito claros da reprodução de aspectos da cultura camponesa no espaço urbano, a partir das atividades que realizamos neste ano com algumas famílias do Bairro Padre Ulrico, das pesquisas e atividades que efetivamos no Projeto Vida no Bairro (2003-2005) e
dos ensinamentos de autores importantes, como Hobsbawm (1973): há uma disseminação da cultura camponesa, que não se restringe, portanto, ao espaço urbano ou ao agrário. Na cidade, há homens e mulheres que também reproduzem ações e pensamentos de origem camponesa A disseminação ocorre, principalmente, em virtude da constante mobilidade das pessoas que se reterritorializam tentando dar continuidade a algumas características da forma de vida que tinham onde viviam anteriormente. Há uma unidade dialética entre a cidade e o campo, o urbano e o rural, nos termos indicados por Lefebvre (1995 [1969]), fato e processo que nos remete a pensar no direito à cidade (LEFEBVRE, 1991) e, simultaneamente, no direito ao campo e no lugar da boa convivência (QUAINI, 2006; 2010; SAQUET, 2011). Ambos os espaços precisam ser compreendidos e trabalhados, em projetos de desenvolvimento territorial e em atividades como a da feira dos saberes e sabores, conjuntamente, sem separação: o direito à cidade passa, necessariamente, pelo direito ao campo (e vice-versa), pois há uma relação de unidade e complementar entre estes espaços, transformados em territórios e lugares de luta por uma vida mais qualificada política, cultural, econômica e ambientalmente.
Referências:
HOBSBAWM, E. J. Peasants and politics, The Journal of Peasant Studies, vol. 1, n. 1, 1973, p. 3-22.
LEFEBVRE, Henri. Lógica formal. Lógica dialética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,1995 [1969].
LEFEBVRE, Henri. O direito à cidade. São Paulo: Moraes, 1991.
QUAINI, Massimo. L’ombra del paesaggio. Orizzonti di un’utopia conviviale.
Reggio Emilia: Diabasis, 2006.
QUAINI, Massimo. Dalla coscienza di classe alla “coscienza di luogo” ovvero “de la lutte des classes à la lutte des places”.Declinazioni del concetto di luogo e di paesaggio. Treviso, Fondazione Benetton,2010, p.1-13.
RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do Poder. São Paulo: Ática, 1993
[1980].
SAQUET, Marcos. Por uma geografia das territorialidades e das temporalidades: uma concepção multidimensional voltada para a cooperação e para o desenvolvimento territorial. São Paulo: Outras Expressões, 2011.
THOMPSON, Edward. Costumes em comum: estudos sobre a cultura popular tradicional. São Paulo: Cia das Letras, 1998.
Marcos Aurelio Saquet
UNIOESTE – Grupo de Estudos Territoriais
matéria publicada originalmente em
http://questaoagrariapr.webs.com/