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O papel e a atuação da Rede Ecovida junto aos camponeses do Noroeste do Paraná: práticas de produção agroecológica

* Texto originalmente postado em julho de 2015.

Por Sandra Mara de Oliveira Soares Escher
Engenheira Agrônoma, MSC em Agroecossistemas
Grupo de Trabalho do Laboratório de Geografia Agrária - LAGEA do DGE - UEM

Conforme nos esclarece Arl e Rhinklin (2001), a Rede Ecovida de Agroecologia foi criada em 1998 e, surge do trabalho de ONGs e de organizações de agricultores existentes no Sul do Brasil, os quais a mais de 20 anos, desenvolvem experiências concretas de organização social, produção e comercialização de alimentos agroecológicos relevando a solidariedade, cooperação, resgate da cultura local e de valorização das pessoas e da vida. A Ecovida tem por missão ser um espaço de articulação, interação e ação para potencializar o desenvolvimento da agroecologia, como parte da construção de um projeto de sociedade que contemple e respeite a realidade de cada local.

Poucos anos após a criação da Rede Ecovida, foi criada a Associação Ecovida de Certificação Participativa, esta, mais especificamente voltada para a certificação e disponibilização do selo de produtos orgânicos. Em 2010, com a previsão de encerramento do prazo para oficializar questões relacionadas à certificação, a Associação foi retomada e constituída como OPAC (Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade), a qual é uma condição para compor o Sistema Brasileiro de Avaliação da Conformidade Orgânica.

A Rede Ecovida e a Associação Ecovida de Certificação Participativa são formadas por grupos e por núcleos regionais, também chamados de “nós”. Esses “nós” tem por missão promover a troca de produtos, informações e credibilidade. A Associação é considerada um braço operacional da Rede Ecovida, para permitir a implementação do processo de certificação, já o núcleo, reúne membros da rede em uma determinada região geográfica com características semelhantes o que facilita a troca de informações e também a certificação participativa. Também ressaltamos que para ocorrer o ingresso de novos associados na Associação Ecovida ou de novos grupos, tanto na Rede quanto na associação, tem que passar pelo Núcleo da região onde estão situados.

Atualmente a organização da Rede Ecovida é composta de 28 núcleos regionais, que agrega quatro mil famílias de agricultores dos três estados do Sul do Brasil, além do extremo Sul de São Paulo. Os grupos e os Núcleos Regionais representam os principais “nós” organizativos desta rede. Sua importância, bem como a dinâmica descentralizada de tomada de decisões, evidenciam a condição multidirecional e descentralizadora da Rede Ecovida. Essa rede possui coordenações estaduais e uma coordenação de toda a Região Sul, porém, elas têm um papel secundário quando comparadas aos grupos e núcleos. No interior dos grupos e dos núcleos é que acontecem as principais decisões e encaminhamentos organizativos da Ecovida.

A partir da capacidade de atuação da Rede Ecovida a mesma passou a ser reconhecida, isto, levou à demanda e pressão para sua extensão para além do Sul do Brasil. Mas como a Rede se afirmava em um reconhecimento histórico e mais orgânico no Sul, o entendimento e a postura da Rede era que deveria ser criadas outras redes regionais, também em torno de identidades já existentes, e, possibilitando a criação de uma rede das redes na esfera nacional, o que se concretiza a partir da realização do I ENA – Encontro Nacional de Agroecologia ocorrido em agosto de 2002, com a organização da ANA – Articulação Nacional de Agroecologia em dezembro de 2002.

No ultimo Seminário Nacional da ANA que aconteceu de 25 a 27 de fevereiro de 2015, na cidade do Rio de Janeiro, houve a participação de 68 pessoas, representantes de diversas redes, fóruns, organizações e movimentos sociais de todas as regiões do Brasil. Do seminário tiraram-se quatro temas prioritários da ANA:
  • Sementes e biodiversidade;
  • ATER e Mercados renovam-se como temas prioritários de ação da ANA;
  • Agrotóxicos como tema central.
  • Luta pelo empoderamento das mulheres como eixo que atravessa e estrutura o conjunto de temas e campos de atuação.
Um espaço importante para o debate e troca de experiências entre os membros da Rede Eco vida é o Encontro Ampliado da Rede Ecovida que é realizado a cada dois anos. O principal objetivo do Encontro é debater o dia a dia dos agroecossitemas familiares, promover um intercambio de informações, técnicas e insumos para a produção ecológica. O 9° Encontro Ampliado foi realizado em abril de 2015 na cidade de Marechal Cândido Rondon, Paraná. Neste encontro reuniram-se em torno de mil e quinhentas pessoas e, durante o encontro foram apresentadas 30 oficinas com temas variados. A foto abaixo demonstra momento de descontração dos participantes do evento.

Foto 1: Imagem de participantes do 9º Encontro Ampliado da Rede Ecovida.

Dito essas informações iniciais sobre a Rede Eco vida, ressaltamos que com a formação da Rede de Agroecologia do Noroeste do Paraná em 2014 iniciamos nessa região os primeiros trabalhos em rede que foram centralizados no resgate e produção de sementes crioulas ou próprias, tendo como foco primeiro o caso do arroz irrigado, que é produzido no município de Querência do Norte.
No decorrer das discussões coletivas, o grupo de camponeses foi se fortalecendo enquanto rede tendo como objetivo geral o trabalho produtivo voltado no sentido de avançar nas experiências agroecológicas e conseguirmos produzir sem a utilização de insumos de base química e sem a utilização de veneno nos tratos culturais, dando prioridade para o domínio da técnica de produção ecológica.
No decorrer dos debates identificamos outros assuntos relevantes a serem tratados no espaço da Rede de Agrocologia e, nesse sentido iniciamos o debate sobre a certificação[1] da produção agroecológica. A discussão sobre a certificação da produção agroecológica na Rede de Agroecologia do Noroeste do PR iniciou-se a partir do Núcleo Arenito Caiuá, o qual participa da rede. O núcleo é formado por um grupo de pessoas interessadas em um determinado assunto, nesse caso, o Núcleo Arenito Caiuá foi criado em 2004 entre as famílias e simboliza o esforço coletivo de agricultores assentados no Noroeste, que procuram contrapor ao sistema agroquímico imposto pela agricultura convencional partindo da agroecologia. Atualmente este Núcleo comporta três grupos com 30 agricultores envolvidos e que também participam da Rede de Agroecologia. A foto abaixo demonstra uma reunião do grupo, num momento de discussões sobre os assuntos pertinentes a Rede de Agroecologia do Noroeste do Paraná.

Foto 2: Reunião do grupo gestor da Rede de Agroecologia do Noroeste do Paraná e coordenadores da Rede Eco Vida.

Como o debate sobre a certificação no geral gera muitas duvidas e desentendimentos - seja por questões metodológicas, seja por questões de princípios - é importante que os agricultores tenham claro que simplesmente cumprir as normas de produção orgânica e colocar um selo de avaliação da conformidade pode ser paliativo e pouco contribui para os reais objetivos da agroecologia, segurança alimentar, equidade social e sustentabilidade ambiental.
Assim, entendemos que o processo de certificação é uma atividade contínua, em que os próprios camponeses estabelecem um calendário de qualificação dos membros das unidades produtoras e por isso é importante inserir o tema “certificação” nos trabalhos da rede. Frente a esta realidade a Rede Ecovida de Agroecologia assume a tarefa de construir um processo diferente de certificação denominado “Participativo em Rede”, o - CPR - que contrapõe o modelo mais comum que é realizado através de auditoria por inspeção externa. As duas fotos abaixo demonstra uma reunião do grupo Avanço Ecológico pertencente ao Núcleo Arenito Caiuá. Nessa reunião a discussão estava sendo em torno do processo de certificação da produção.









Fotos 3 e 4: Reunião mensal do Núcleo Arenito Caiuá - Grupo Avanço Ecológico. 

A título de uma breve consideração, podemos dizer que no Noroeste, temos procurado trabalhar o sentido de uma transformação no processo produtivo camponês. Na realidade, entendemos que essa prática não é nova, o camponês em sua trajetória sempre produziu de forma agroecológica. As mudanças impostas pela agricultura tecnificada contemporânea - pós 1970 - é que causou transformações em sue modo de produzir. O que temos feito agora é retornar ao processo produtivo no qual incorporamos tecnologias e excluímos o veneno. Essa é a verdadeira prática do sujeito do campo, que produz alimento ao povo brasileiro.

[1] De acordo com informações da cartilha “CONSTRUINDO A CERTIFICAÇÃO PARTICIPATIVA EM REDE NO BRASIL” (2004), a Certificação é o procedimento pelo qual órgãos de certificação oficial ou organismos de certificação oficialmente reconhecidos, fornecem por escrito, ou outro equivalente de segurança, que os alimentos ou sistemas de controle de alimentos, estão conforme as exigências especificadas. A certificação do alimento pode ser quando apropriado, baseada numa série de atividades de inspeção que pode incluir inspeção contínua na linha, auditoria dos Sistemas de Garantia da Qualidade e, exame dos produtos finais. Sistemas de certificação significam sistemas de certificação oficiais e reconhecidos oficialmente, isto é, um conjunto de atividades implementadas para avaliar a conformidade do produto, processo ou serviço a requisitos especificados. A finalidade da certificação é atribuir um ao produto, processo ou serviço, reconhecido pelos consumidores e pelos produtores. 

REFERÊNCIAS:

ARL,Valdemar; RHINKLIN, Hansjörg. Agroecologia. 3 ed. Caçador, SC. Cepagri e Terra Nova. 2001. Livro Verde 2

CONSTRUINDO A CERTIFICAÇÃO PARTICIPATIVA EM REDE NO BRASIL: cartilha para subsidiar as oficinas locais. Florianópolis: Grupo de Agricultura Orgânica, 2004, 44 p. Disponível em:

ECOVIDA ONLINE. 2011. Quem somos. Disponível em: http://www.ecovida.org.br/?sc=SA002&stp=STP0002. Acesso em: 05 de jul. de 2015.

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