Diante da criminalização da luta camponesa nos municípios de Quedas do Iguaçu e Rio Bonito do Iguaçu, inclusive com pronunciamento do Senador Álvaro Dias na tribuna do Senado Federal em defesa do latifúndio Araupel, o GEOLUTAS reproduz carta elaborada pela coordenação regional do MST com a intenção de esclarecer os fatos ocorridos e somar esforços na conquista e construção do território camponês.
DENÚNCIA DE
CRIMINALIZAÇÃO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS
A perseguição aos movimentos sociais na
tentativa de enquadrá-los como criminosos, Istoé, criminalizá-los, é prática
recorrente e cada vez mais sofisticada utilizada por grupos que se sentem
ameaçados por manifestações das organizações sociais e historicamente esses
grupos agem em conluio com a parte conservadora do Estado, deslocando para a
política criminal e de segurança pública as ações dos movimentos que exigem
apenas política social, e para isso, encontram guarida no judiciário,
legislativo e na mídia conservadora.
Neste dia 13 de maio de 2014, iniciou-se
uma orquestrada perseguição ao Movimento Sem Terra – MST, na região Centro
Oeste do Paraná, tendo como cenário os seguintes fatos:
1. A referida região tem um dos mais
baixos IDHs do sul do país, e conta com um grande contingente de trabalhadores
sem terra, e paradoxalmente, neste território se encontra um dos maiores e mais
injusto latifúndio, conseguido de forma fraudulenta pelo então grupo
Giacomet-Marodin, que alterou sua razão social para Araupel, na tentativa de
desvincular seu nome dos crimes cometidos na região.
2. Em 1996, após ocupação pacífica de
parte da área da Giacomet por trabalhadores sem terra, o Incra implantou um
assentamento, pagando para a empresa tudo o que ela havia obtido de forma
obscura, e após outra ocupação, houve outro assentamento, cuja área encontra-se
sub-júdice, devido o INCRA ter constatado a nulidade do título de propriedade.
3. Mesmo que tais fatos sejam de
conhecimento público e notório, o senado Tucano Álvaro Dias, conhecido como
Catão de Pinhais, não se eximiu de mentir despudoradamente e sem vermelhar o
botox facial, do alto da tribuna do senado, ao dizer que a Araupel fez doação
da área para assentamento, sendo que o tipo de doação que a empresa costuma
fazer é para campanhas eleitorais, a exemplo da feita para o prefeito tucano de
Quedas do Iguaçu, que esteve em Brasília em defesa de seus financiadores. (a
afirmação da doação consta em vídeo).
4. No dia primeiro de maio, um grupo de
trabalhadores sem terra, hoje em torno de mil e seiscentas famílias formadas na
maioria por filhos de assentados, acampou-se em área do Projeto de Assentamento
Ireno Alves, em Rio Bonito do Iguaçu-PR. Essa ação pacífica dos trabalhadores
provocou a deflagração de ações de criminalização, consubstanciada nos
seguintes fatos:
A.
Primeiramente a polícia do Estado invadiu residência de assentados sem mandado
judicial, violando princípios elementares da Constituição.
B.
Em 30 de abril, enquanto o Incra, por intermédio de seu presidente, e a UFFS,
representada pelo Vive-Reitor, firmavam parceria para construção de uma
extensão da Universidade dentro do Assentamento, a justiça expedia mandado de
busca e apreensão a ser realizada na casa de assentados e de um professor da
UFFS. As buscas foram realizadas no dia 13 de maio, fundamentada em inferências
ou suposições sem um mínimo de respaldo em fatos. O professor da UFFS foi
retirado por policiais da sala de aula, onde aplicava avaliação aos alunos,
para o cumprimento do mandado. A polícia ingressou no ambiente acadêmico sem
aviso ou autorização do Diretor do Campus.
C.
As vitimas dos abusos, um assentado do assentamento Ireno Alves, um assentado
do assentamento Celso Furtado, e um professor da UFFS, tiveram suas residências
reviradas, suas famílias constrangidas e expostas à humilhação, num frontal
desrespeito aos direitos fundamentais, por atos discricionários e infundados de
um judiciário que se projeta no mesmo rumo autoritário e ilimitado que tem
atuado o presidente da instância máxima do judiciário.
5. Entendemos
que a reforma agrária deve estar pautada na política econômica do país, assim
como se encontra definida na Constituição Federal, ademais, é esta política
efetiva para resolver problemas sociais e alavancar a economia local. Portanto,
não pode a reforma agrária ser transferida para a área criminal, sendo tratada como
caso de polícia.
6. A reivindicação das famílias sem
terra é a mesma de sempre, a reforma agrária, a conquista da terra para dela
tirarem a subsistência e viverem com dignidade. As manifestações
reivindicativas são sempre de forma pacífica e legítimas conforme as regras da
democracia, da livre expressão e manifestação. Portanto, como criminosos devem
ser tratados aqueles que grilaram ou de qualquer forma se apoderaram
ilegalmente de terras públicas.
7. Diante da realidade exposta,
repudiamos a criminalização dos movimentos sociais e perseguição à suas
lideranças, assim como contestamos a ação policial que envolveu mais de uma
centena de policiais e perto de 50 viaturas, num completo desnecessário
dispêndio de recurso público, no mesmo período que o Governador do Estado não
investe o básico em educação, saúde, moradia, etc.
8. Frente a esta situação, e sem
prejuízo de outras que ajudem a solucionar ou evitar possível conflito,
reivindicamos:
A.
Que o governo federal, competente para atuar na área da reforma agrária,
através do respectivo Ministério e do Incra, tome as medidas cabíveis a fim de
atender a reivindicação de terra feita pelas famílias sem terra, iniciando pelo
levantamento da cadeia dominial da área pertencente à Araupel, para comprovar
sua origem que dá ensejo a nulidade d o título;
B.
Que o estado do Paraná, através de sua ouvidoria agrária, tome providências
para cessar a perseguição, reservando a policia para sua missão institucional e
não para defender interesses meramente privados, como são os da Araupel;
C.
Que a Comissão de Direitos Humanos da Câmara tome medidas sobre as violações de
direitos humanos citadas e sobre as ameaças feitas pela Araupel, inclusive a
funcionários do Incra.
Rio Bonito do Iguaçu, 14 de Maio de 2014
Coordenação do Movimento Sem Terra
Região Centro Oeste do Paraná
Postado
originalmente em: http://questaoagrariapr.webs.com em 28 de maio de 2014