CONSERVAÇÃO E USO SUSTENTÁVEL DE RECURSOS HÍDRICOS COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO AMBIENTAL EM UNIDADES RURAIS FAMILIARES COM PRODUÇÃO AGROECOLÓGICA NO MUNICÍPIO DE FRANCISCO BELTRÃO – PR
CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROJETO
A água é um recurso indispensável para manutenção da vida de todos os seres vivos e para o desenvolvimento social e econômico. O acelerado quadro de crescimento populacional, o aumento da urbanização, da produção industrial e das áreas de agricultura e pecuária vem gerando uma demanda cada vez maior pelo uso da água, pondo em risco a sua disponibilidade. Ao mesmo tempo, o despejo de resíduos domésticos, industriais ou agrícolas (líquidos ou sólidos); a ocupação imprópria das margens de rios com consequente destruição das matas ciliares; entre outros usos indevidos das águas, acarretam em uma diminuição constante da qualidade adequada da mesma para o consumo. Consequentemente, a questão da água já vem gerando grandes preocupações em todo o mundo.
O estado do Paraná encontra-se em uma região bastante privilegiada no que diz respeito à ocorrência de recursos hídricos e ao regime das chuvas. Ainda assim, ocorrem períodos de escassez de água em algumas épocas do ano, principalmente em comunidades rurais, que dependem das fontes naturais de abastecimento existentes em cada propriedade. Além dos problemas de quantidade de água, a deterioração das matas ciliares, a falta de proteção adequada das nascentes, o uso intensivo de agroquímicos e a carência de saneamento básico são fatores que deterioram a qualidade das águas, levando à sua contaminação e comprometendo sua disponibilidade.
Esses problemas devem ser alvo de uma ação emergencial do Estado, através de políticas públicas que procurem reduzir a contaminação das águas no meio rural e melhorar a quantidade e qualidade das águas. Nesse sentido, existem algumas medidas simples, mas muito eficientes para a preservação e conservação de recursos hídricos, como:
1) a implantação de sistemas de captação de águas pluviais (cisternas);
2) o saneamento nas unidades rurais com métodos simples de tratamento de efluentes (esgoto e águas residuais);
3) a proteção de fontes superficiais de água, para evitar a contaminação microbiológica e química dos corpos hídricos;
4) a recomposição florestal de Áreas de Preservação Permanentes (APPs), nas margens de rios, entorno de nascentes e encostas declivosas; e
5) a correta destinação e tratamento de efluentes animais (dejetos de aves, suínos, bovinos, etc.).
Considerando a existência de agricultores que trabalham com produção orgânica de alimentos, a importância da água para a saúde das famílias rurais e para a agricultura, além dos diversos problemas ambientais e sociais relacionados ao mau uso dos recursos hídricos, procuramos através de um projeto de pesquisa e extensão financiado CNPq, conhecer os usos dos recursos hídricos e contribuir para a melhoria da qualidade e da quantidade de água em estabelecimentos rurais com agricultura orgânica em Francisco Beltrão. O projeto Conservação e uso sustentável de recursos hídricos como instrumento de gestão ambiental em unidades rurais familiares com produção agroecológica no município de Francisco Beltrão – PR teve como objetivo principal diagnosticar a disponibilidade e os usos da água em 11 Unidades de Produção e Vida Familiares com agricultura orgânica, para direcionar ações de melhoria da qualidade e da quantidade das águas nessas propriedades.
O projeto foi desenvolvido entre 2009 e 2012, e coordenado pelo prof. Dr. Luciano Z. P. Candiotto, do Grupo de Estudos Territoriais (GETERR), da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus de Francisco Beltrão/PR. Os recursos financeiros para seu desenvolvimento foram provenientes do CNPq, através do Edital MCT/CNPq/CT-AGRONEGÓCIO/CT-HIDRO Nº 27/2008. O número do processo foi n. 574050/2008-6.
RESULTADOS
As principais ações executadas no projeto foram as seguintes:
- Proteção de fontes superficiais de água usadas para consumo ou irrigação, que apresentaram problemas de contaminação microbiológica nas análises.
- Cercamento do entorno das fontes protegidas e plantio de mudas nativas nessas áreas de preservação permanentes.
- Construção de cisternas e reforma de calhas em telhados dos estabelecimentos rurais com produção de hortaliças.
- Instalação de bebedouros para animais; de sistemas de destinação e tratamento de esgoto (canteiro biosséptico e fossa séptica) e de sistemas de círculo de bananeiras para destinação de efluentes domésticos (água de pias, tanques e banho).
- Reformas de 2 sistemas de irrigação e construção de um chiqueiro e de duas esterqueiras para coleta de dejetos suínos.
- Instalação de um sistema de aquecimento solar de água, para uso na residência de uma família.
- Mapeamento dos estabelecimentos rurais beneficiários, considerando limites, usos do solo, rede hidrográfica, áreas de preservação existentes e ideais, benfeitorias.
- Realização de um seminário na UNIOESTE para debater o tema.
- Apresentações e publicações de trabalhos relacionados ao projeto, em eventos científicos.
- Produção de um vídeo com os resultados do projeto (http://www.youtube.com/watch?v=WtUEezLracQ&feature=youtu.be).
- Monitoramento do funcionamento dos equipamentos e instalações do projeto durante o ano de 2013 e comprovação da eficácia das ações realizadas.
O desenvolvimento do projeto permitiu à equipe executora, elaborar e aplicar um roteiro de questões por meio de uma entrevista com cada família beneficiária, que fundamentou o diagnóstico de cada Unidade de Produção e Vida Familiar (UPVF). Durante a elaboração do roteiro, a equipe pode refletir sobre as questões a serem feitas para o bom andamento do projeto, considerando informações qualitativas e quantitativas. Assim, apenas a etapa de diagnóstico já foi importante para avançar no estado da arte em relação à disponibilidade, aos usos e aos problemas atinentes aos recursos hídricos em cada UPVF.
As principais contribuições do projeto dizem respeito às tecnologias de base ecológica utilizadas para a conservação dos recursos hídricos. Elas são, sobretudo, produtos do desenvolvimento do projeto, como os dois sistemas de proteção de fontes de água (solo-cimento para fontes pequenas e tubos de concreto para fontes grandes); as cisternas (construídas com arame, cimento e areia); os canteiros biossépticos (sistema de fossa utilizando a evapotranspiração de plantas para decompor e eliminar os resíduos provenientes dos dejetos humanos) onde não há nenhuma infiltração desses dejetos no solo e em águas superficiais e subterrâneas; os círculos de bananeira (que recebem águas residuais de tanques de lavar roupas, chuveiro e pias); as esterqueiras para destinação dos dejetos suínos; os bebedouros de água para animais; o aquecedor solar com painel construído com materiais reciclados; os sistemas de irrigação (por aspersão e gotejamento); e os mapas de cada estabelecimento rural, produzidos pela equipe do projeto.
É importante ressaltar que para definir as ações para cada UPVF, a equipe estabeleceu um processo de pesquisa e diálogo a respeito dos tipos de materiais, metodologias e procedimentos a serem utilizados, através da consulta de artigos, dissertações, cartilhas, sites e das próprias experiências já implementadas pela Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural - ASSESOAR (cisternas e aquecedor solar) e pela Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar - FETRAF Sul (sistemas de proteção de fontes de água). Outro elemento a destacar, reside no fato de que a equipe do projeto aperfeiçoou algumas tecnologias, como o sistema de descarte das águas pluviais que passam pelo telhado da casa após o início das chuvas (cisterna); instalação de bombas nas cisternas; adequações do canteiro biosséptico (proteção da pirâmide de tijolos); instalação de caixas de gordura antes dos círculos de bananeira (com o objetivo de reduzir a possibilidade de entupimento dos canos), priorizando o uso de materiais recicláveis. Todas as ações do projeto indicam para a pertinência e viabilidade de criação de políticas públicas destinadas à melhoria dos recursos hídricos em estabelecimentos rurais.
Os principais resultados do projeto foram os seguintes:
1. Proteção de 8 fontes subsuperficiais de água usadas para consumo ou irrigação, que apresentaram problemas de contaminação microbiológica;
2. Cercamento do entorno das fontes protegidas e plantio de mudas nativas frutíferas nas áreas de preservação permanentes;
3. Construção de 5 cisternas e reforma de calhas em telhados dos estabelecimentos rurais com produção de hortaliças
4. Instalação de 9 bebedouros para animais e reforma de 2 sistemas de irrigação.
5. Construção de sistemas de destinação e tratamento de esgoto (9 canteiros biossépticos e 1 fossa séptica).
6. Oito círculos de bananeiras para destinação de efluentes domésticos (pias, tanques de lavar roupas e águas de banho).
7. Retirada de 1 chiqueiro em APP e construção de 1 chiqueiro e de 2 esterqueiras para coleta de dejetos suínos.
8. Instalação de 1 sistema de aquecimento solar de água, para uso na residência de uma família.
9. Mapeamento dos estabelecimentos rurais e produção de um vídeo com os resultados do projeto, disponível no youtube (http://www.youtube.com/watch?v=WtUEezLracQ&feature=youtu.be).
O projeto demonstrou que é possível minimizar e solucionar problemas graves, com poucos recursos e com tecnologias de baixo custo. Assim, pretendemos levar os resultados do projeto para prefeitos e outros administradores da região Sudoeste do Paraná e de outros municípios do país. Nesse sentido, a divulgação do vídeo do projeto na internet contribuirá nesse processo.
Desde a submissão da proposta, tínhamos por objetivo desenvolver as ações do projeto como uma demonstração da viabilidade de se conservar os recursos hídricos com técnicas simples, baratas e eficazes. Assim, esse projeto foi concebido como um projeto-piloto, que ao ser finalizado, se apresentaria como referência para outros estabelecimentos rurais. Os resultados indicam a viabilidade das tecnologias implementadas e o fato de serem tecnologias simples, permite que os próprios agricultores se apropriem desses conhecimentos, de modo que eles mesmos possam construir essas tecnologias em curto, médio e longo prazos. Assim, essas tecnologias poderão ser replicadas para outros estabelecimentos rurais da região Sudoeste do Paraná, sejam eles orgânicos ou não.
Unioeste - Grupo de Estudos Territoriais
Matéria publicada originalmente em